terça-feira, 4 de outubro de 2011

Gisele Bündchen incomoda tutores estatais

O Globo, Editorial
 
Desde 2003, com a vitória eleitoral da aliança lulopetista, a sociedade tem sido surpreendida, de tempos em tempos, por atitudes de autoridades federais dentro do figurino de regimes não democráticos, em alguns casos sem nada a dever ao pensamento de grupos fundamentalistas conservadores.

Numa visão superficial da colcha de retalhos político-ideológica existente no país, seria algo incoerente, pois grupos que desembarcaram em Brasília em 2003 na caravana vitoriosa lulopetista sempre procuraram ser vistos como progressistas, autênticos democratas.

Engano. Na verdade, sempre fizeram parte das alianças de esquerda frações autoritárias, defensoras de um Estado forte a pairar sobre uma sociedade incapaz de decidir o que é bom para ela.


Serão estes agentes da clarividência, donos de verdades inabaláveis, que irão “proteger” a população contra maus hábitos e más influências. Neste mesmo coquetel ideológico há, misturado, o ingrediente do “politicamente correto”, de cujo jargão, por exemplo, fazem parte termos como “afrobrasileiro”.

É uma espécie de cultura refratária à leveza de espírito e ao bom humor que um dia já foram considerados aspectos da alma brasileira.

O mais recente exemplo de ação desses grupos infiltrados no poder é a reação da titular da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), Iriny Lopes, a uma campanha publicitária de roupas íntimas femininas, estrelada pela modelo Gisele Bündchen.

Em três comerciais para TV bem humorados — grave delito —, a agência de publicidade usou o clichê da mulher que usa a beleza para conseguir o que quer dos homens para expor alguns produtos do anunciante.

Foi demais, e a secretária formalizou ao Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) pedido de suspensão da campanha, por “falta de respeito à condição feminina”, tendo considerado as peças “preconceituosas e discriminatórias”. O Conar instalou processo, a ser julgado em breve. Cumpre seu papel.

Menos mal que a SPM recorreu ao órgão de autorregulamentação. Não fez como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da Saúde, contumaz infratora da Constituição ao tentar censurar propagandas quando as considera daninhas ao brasileiro.

Na Anvisa existe outro bunker de tutores estatais do brasileiro, um povo sem condições de comprar os alimentos mais saudáveis, de se medicar, e assim por diante.

Não é um problema haver reações negativas a campanhas publicitárias ou ao que seja.
Tratam-se de fatos normais numa democracia.

Anormal é quando grupos militantes de pressão, por contingências político-partidárias, passam a controlar instrumentos públicos para impor seu projeto ideológico.

Este aparelho feminista instalado no governo convive lado a lado com outra secretaria cuja missão é executar no Brasil um projeto racialista. Devido a este aparelhamento é que foi tentado contrabandear para o programa de Defesa de Direitos Humanos a censura à imprensa para o caso de divulgação de supostas ideias racistas.

O ataque da SPM à propaganda com Gisele Bündchen não é cômico. Poderia, mas se trata de algo mais sério, por ser nova tentativa de comissários de intervir na liberdade da produção audiovisual brasileira.

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